De como fazer filosofia sem ser grego, estar morto ou ser gênio
Gonçalo Armijos Palácios, Editora UFG, 1997
Demorei muito tempo para começar a ler esse texto. O autor esteve em Marília para debater suas posições, mas eu, infelizmente, não compareci, embora tenha debatido com o professor Lúcio, no mesmo evento, teses que se aproximam muito das defendidas por Palácios, fruto sobremaneira de minha passagem pelo curso de História, exatamente da disciplina de História Econômica, onde se discute a diferença entre métodos de economia e métodos de história econômica, de onde decorre que haja uma diferença entre economistas e historiadores da economia. O ônus pelo atraso na leitura deste livro é todo meu já que, neste curto texto marginal, publicado por uma pequena editora universitária, por um autor desconhecido até mesmo do público filosófico especializado, há uma reflexão metafilosófica que supreende. Surpreende porque o autor vai ao cerne da produção filosófica brasileira, questionando este fazer filosófico nesta terra brasilis marcado por formas, teses e métodos específicos. Já tivemos a oportunidade de apontar que forma e conteúdo estão intimamente relacionados e de como uma determina e é determinada pelo outra. Do mesmo modo, na vasta produção filosófica brasileira, há formas muito bem marcadas que se espera de uma tese, logo, certo conteúdo a ser expresso: o conceito de algo em alguém, eis a forma-conteúdo básica de uma dissertação ou tese de filosofia no Brasil. Outras teses, que rondaram e rondam o panorama filosófico, é o privilégio de certos idiomas, tomados como o suprassumo de veículo filosófico, o que se expressa, muito claramente, nas línguas exigidas nos programas de pós-graduação. Do mesmo modo, certos métodos de leitura filosófica, fundamentalmente o estruturalismo francês, são martelados na cabeça dos neófitos como o método de leitura filosófica por excelência, se não o único. Palácios trabalha com estes problemas, mostrando como estas teses (forma-conteúdo, privilégio linguístico e forma-glosa) moldaram o panorama filosófico nacional, constituindo-se em verdadeiro empecilho nas tentativas de filosofar. Outro entrave à filosofia seria a cultura da formação do erudito em detrimento da escrita; o erudito, isto é, o leitor de muitas obras, não necessariamente será um filósofo, tampouco o escritor, mas este tem a vantagem de expressar suas ideias, torná-las clara, tentar se explicar. Exatamente por quê escrevemos para ser entendidos, deve-se minorar as tentativas de leituras exóticas sobre os autores distintos, especialmente os velhos gregos, ao menos segundo Palácios. O autor também discute a oposição entre filosofia e história da filosofia, chegando a uma posição média: não abandonar nem uma nem outra, ou seja, nem ser meros comentadores de obras que já não interessam a ninguém, à exceção de meia dúzia de especialistas, nem ignorar que outros já trataram de nossos problemas. Há variadas posições filosóficas contidas nas teses do autor, o que não diminui sua importância, aliás, a engrandece, posto que Palácios ousou filosofar, defendendo precisamente isto: chega de nos fiarmos em autores estrangeiros, virando as costas à nossa realidade. A filosofia é característica comum dos humanos, que são curiosos por natureza; neste ínterim, a filosofia deve servir para ajudar-nos a dar novas respostas a velhos problemas, ou, mesmo, criar novos problemas, sempre orientados para o presente, para nossa época, posto que o saber tem história e geografia. Os grandes filósofos se destacaram por se ater a seu tempo, aos problemas prementes de uma era. Façamos como eles: ousemos filosofar, não ignorando o passado, mas sem sermos prisioneiros dele. Orientamos nosso pensamento ao porvir. Este é o caminho para a produção filosófica autoral nesta terra de colonos, sujeita às influências atlânticas, como mostra Cruz Costa, mas com perspectivas do sertão, nossas raízes mais profundas.
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