segunda-feira, 7 de setembro de 2020

Análise de conjuntura

 Um dos primeiros tratados de política foi o livro homônimo de Aristóteles, Política. Neste como em outros textos o brilhantismo do Estagirita, como também é conhecido o filósofo, aflora. No atual momento, me chama atenção em específico a parte em que ele aborda as mudanças de regime. Aristóteles afirma que a base de um estado estável é a existência de uma classe média [to mesoi] firme, bem estabelecida. Quanto mais bem assentada for a classe média, ele nos diz, tanto mais firme será o regime. Tornada débil, as chances de revolução aumentam, com a consequente mudança de organização social. No pós -guerra, essa parece ter sido uma lição aprendida pelo Ocidente. Não só se verificou um crescimento econômico sem precedentes, como o produto social era dividido através do Estado, ou, talvez, mais bem dividido do que atualmente. Essa prosperidade caçou o espírito revolucionário das classes trabalhadoras nos países ricos em plena guerra fria,restringindo este aos guetos ou à populações ou países marginalizados, que não tinham parte na bonança global. Veio a contrarrevolução neoliberal e o assim chamado Estado de bem-estar social começou a ser dilapidado. As elites globais bem como as regionais passaram a apostar em um empobrecimento das classes inferiores, e buscavam quebrar a espinha dorsal do movimento operário de então, os sindicatos, em um contexto de URSS combalida e enfrentando dificuldades internas, como dissidências. Os anos correram, a URSS caiu, e a estratégia se aprofundou. O neoliberalismo e sua terceirização acabou com o poder dos sindicatos. A social democracia se bandeou para outro time e os empregos industriais do Ocidente migraram para o outro lado do mundo. Agora, no Ocidente, temos uma mistura de empregos precários e pauperização. A saudade de um tempo ido alimenta a extrema direita, e a esquerda, desprovida de sua base operária, encontra-se defendendo pautas rigidamente liberais, como casamento LGBT ou uso recreativo da maconha. Desorganizados, tudo se tolhe dos pobres. Se esse coquetel de condições é molotov, bastante explosivo, a ausência de uma perspectiva de luta somada a uma esquerda totalmente eleitoreira e adaptada dificulta o tracejo de estratégias. Em algum sentido, regredimos aos primórdios do capitalismo; em outro, estamos ainda piores do que lá, visto que nos falta o sentido de coletividade que os trabalhadores do campo chegando à cidade possuíam. Para ser viável e fugir das pequenas revoltas, como Junho, e suas pequenas vitórias, é necessário organização. Não um ou outro partido; organizações de classe. A crise não é de direção, mas de organicidade. Superar essa situação, com organizações de bairro, de estudo ou de trabalho é nossa principal tarefa. Nesse último caso, agravado pela burocracia, peleguismo e baixo número de militantes. Eu mesmo não me encontro militando após um grande período de atuação contínua. Convencer os velhos militantes é parte da tarefa. Ninguém falou que seria fácil mudar o mundo. A desesperança joga para o partido adversário. Sejamos crentes que a situação é explosiva e atuemos para potencializá-la em processos consistentes; afinal, trazemos um mundo novo em nossos corações.

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